domingo, 29 de abril de 2012

TRANSCENDER-SE DA IMANÊNCIA PELA VIA MÍSTICA












                                                                                  (*)Fausto Martins de Moura
              







Resumo


A partir do estudo de doze tratados da obra de Plotino intitulada “Enéadas” (palavra grega, que significa em português novenas) foi possível perceber, o que se depreende por transcendência: o ato de ir além de tudo; por imanência: o ato limitante em si mesmo; por mística: a doutrina que admite uma comunicação entre o humano e Deus. Estes fatores estão enlaçados na experiência da contemplação de Deus, que na concepção plotiniana tem como melhor nome “Uno”, a fonte emanadora de todas as coisas e da qual emanou-se: o “Ser”, a “Inteligência” e a “Alma”.


A intenção inicial em refletir a temática: “transcender-se da imanência pela via mística” nos ensinamentos de Plotino surgiu da necessidade de conhecer sua doutrina (pagã), a qual livre de qualquer instituição foi capaz de influenciar os vários pilares religiosos do século III d.C. até a atualidade, século XXI. A segunda intenção e com certa ousadia, foi conhecer mais de perto os ensinamentos do pai do neoplatonismo e da mística. A terceira intenção veio por influência cristã e pelo estudo da Filosofia.  

       

Palavras-chave: transcendência; imanência; mística; Uno; Ser; Inteligência e Alma.




Compreendendo a transcendência, a imanência e a mística na doutrina plotiniana



Dos ensinamentos de Plotino, entende-se que há uma possibilidade de romper todos os limites possíveis da realidade física (alcançada pela percepção dos sentidos) que é a imanência. Esse romper para além da experiência física é a transcendência; e quando isso acontece pela via mística, que é uma comunicação particular entre o humano e a divindade, então se dá o êxtase, a beatitude, o ponto pleno da união com Deus.


A superação da condição limite de tempo e espaço (imanência), em Plotino, se dá pela via contemplativa de Deus, que é, segundo ele, absolutamente transcendente (além de tudo), superior a todo pensamento, a todo ser. Supera toda denominação afirmativa para defini-lo, portanto a negação de tudo o que possa dizê-lo é a sua própria transcendência. “Na verdade, nenhum nome pode ser atribuído adequadamente a ele; no entanto, como é preciso nomeá-lo, pode ser chamado de Uno(PLOTINO, 2002, p. 130; En. IX)


A reflexão aqui apresentada permite entender o que Plotino como neoplatônico apreende com relação ao Uno, quando cita: “Platão diz que o Uno não pode ser nem objeto de discurso, nem de escrita” (PLOTINO, 2002, p. 127; En. IX). Entende-se daí que, escrever algo sobre o Uno, seria apenas um suporte para motivar o desejo de contemplá-lo, mas jamais explicá-lo, pois ele está para além do conhecimento racional; mesmo porque na denominação de Deus como Uno, Plotino explica muito bem que: “A sua Unidade não deve ser confundida com a unidade numérica, ou a do ponto geométrico” (PLOTINO, 2002, p. 131; En. IX), pois essas duas unidades são puramente atividades racionais, e o Uno vai para além disso, por ser ele, uma potência que engendra todos os seres sem qualquer alteração, a qual não se aumenta e nem diminui, pois tudo o que é alguma coisa ou ser provém de Deus.


O Uno se propaga sem sair de si mesmo, num processo denominado emanação, onde toda multiplicidade está contida indivisivelmente, e “por mais Uno que o tenhas imaginado, ele é mais que isso. Pois ele é em si mesmo, sem que nenhum predicado lhe possa ser atribuído” (PLOTINO, 2002, p. 132; En. IX). Portanto, o Uno em Plotino é Deus transcendente.




Do Uno (Deus), donde tudo se emana – o Ser, a Inteligência, a Alma



Plotino concebe o Uno, como sendo o princípio de todas as coisas de um jeito superabundante, transbordante, transcendente. O Uno não é um ser, porque dele provém o Ser; e para que algo possa existir, o Uno não pode sê-lo, nem possuí-lo, nem buscá-lo, porque o Uno permanece imóvel e inalterável; pode-se dizer que o Ser “é o primeiro ato da geração do Uno” (PLOTINO, 2002, p. 63; En. XI), que por meio de sua perfeição emanadora: “transbordou e sua superabundância produziu algo diverso dele mesmo” (PLOTINO, 2002, p. 63; En. XI). Há um retorno do que foi produzido para a fonte originária, acontecendo, então, a contemplação; e desta contemplação há um preencher do Ser tornando-o Inteligência, que por sua vez é consequência da relação do ato de se contemplar o Uno. A partir desta relação contemplativa emanou-se o Ser e a Inteligência ao mesmo tempo, os quais assemelhando-se ao Uno e também repetindo o seu ato, emitiram um imenso poder dando-se um “segundo transbordamento, o da essência da Inteligência, a Alma” (PLOTINO, 2002, p. 64; En. XI).


A Alma que proveio da Inteligência “surgiu como uma ideia e um ato da Inteligência imóvel” (PLOTINO, 2002, p. 64; En. XI); que também permaneceu inalterada, mas a Alma não é imóvel, ela se manifesta por meio da contemplação de sua fonte originária, e sendo preenchida por ela empreende um movimento contrário (descendente), gerando a própria imagem, tão distinta que, se opõe a essência ou substância, que significa uma atividade instável: “Essa imagem da Alma são os sentidos e o princípio vegetativo” (PLOTINO, 2002, p. 64; En. XI); que vai do mundo inteligível ao sensível, a qual pode oscilar como um movimento, ora ascendente, ora descendente.  


Há, portanto, três faculdades da Alma: a primeira, enquanto é a hipóstase (substância) condicionada na espécie vegetal, ela é considerada “a mais rebelde e menos intelectual delas” (PLOTINO, 2002, p. 65; En. XI); a segunda, enquanto condicionada na espécie animal, “o que prevalece e a conduz para lá é a faculdade sensorial” (PLOTINO, 2002, p. 65; En. XI), que se manifesta por meio da percepção dos sentidos físicos externos: visão, audição, olfato, paladar e tato; e a terceira, enquanto condicionada na espécie humana, “o que prevalece no momento exteriorizante é a faculdade racional” (PLOTINO, 2002, p. 65; En. XI). Consequentemente, a alma enquanto sensível material dotada da razão, se realiza na medida em que, por meio de um processo de interiorização (a via contemplativa), procura se elevar da própria condição inferior, para a condição superior inteligível e se conectar ao que nela existe de semelhante, que é a sua fonte de origem.


A alma humana, por consequência do movimento “tendo se originado da Inteligência, tem esse princípio (arché) imanente em si, ela tem um desejo inato pela atividade intelectual e pelo movimente em geral” (PLOTINO, 2002, p. 65; En. XI). Assim, entende-se que, a matéria é limitada e limitante, quer dizer, está presente numa situação de condição espacial e temporal, mas Plotino dá a entender claramente sobre o movimento que se dá a alma condicionada numa espécie material vegetativa, ele diz que o seu movimento é permanente em sua origem, mesmo quando cortados os seus galhos e ramos ou o todo destruído pelo fogo, a alma desta espécie volta sempre ao seu princípio: “não se move espacialmente, pois, como não se separa de seu principio, está sempre com sua origem” (PLOTINO, 2002, p. 66; En. XI). Quando se trata aqui de movimento, trata-se de um retorno por ter estado em algo, do contrário, se a alma eleva-se “é em direção ao poder da Alma que a precede, que por sua vez tenderá ao poder da alma ainda mais alta, e até chegar à Inteligência” (PLOTINO, 2002, p. 66; En. XI). Esse processo da alma não pode ser entendido espacialmente “A Alma nunca esteve no espaço, e a Inteligência divina muito menos ainda, pois é ainda mais livre” (PLOTINO, 2002, p. 66; En. XI).


A liberdade da alma consiste num processo intrínseco à sua essência; ela precisa ascender da sua condição material, para alcançar em seu caminho, a libertação de sua inferioridade, para daí, chegar ao que é real e perfeito, incorruptível, a Inteligência divina. Portanto se durante esse processo “a Alma se detém na metade do percurso, antes de chegar às alturas supremas, então ela terá uma vida remediada e permanecerá no nível médio de si mesma” (PLOTINO, 2002, p. 66; En. XI); e em sua espécie singular, instala-se numa contínua seqüência de atos que se estendem permanentemente em busca de se aperfeiçoar na Inteligência, de onde ela provém, “embora cada parte diferencie-se da outra e a anterior não se perca na posterior” (PLOTINO, 2002, p. 66; En. XI).  


Resumindo: Plotino explica perfeitamente que por meio da contemplação do Uno, o ato gerador é constante. A cada transbordamento emana-se um ser distinto, que retorna ao Uno (a fonte geradora), e desse retorno há um aperfeiçoamento do ser, uma assemelhação que emite uma poderosa natureza emanadora; e cada emanação é descendente das posteriores e assim consecutivamente e eternamente.




A via para a contemplação do Uno (Deus)



Em Plotino, no que diz respeito à experiência contemplativa de Deus nota-se a necessidade de uma conversão, a qual exige rigor consigo mesmo para a tão desejada visão do Belo, do Bem: “Como Bem, ele é desejado e o desejo tende para ele; mas só o alcançam aqueles que se elevam à região superior e se despojam das vestes que colocaram em sua descida” (PLOTINO, 2002, p. 30; En. I). Entende-se daí que, para realizar o desejo e a busca da fonte de origem é preciso uma mudança interior, um esvaziamento de todas as coisas e de si mesmo, possibilitando uma autopurificação para assim, então, ascender-se e “até que, tendo abandonado nessa subida tudo o que é estranho a Deus, vejam sozinhos, em seu isolamento, simplicidade e pureza” (PLOTINO, 2002, p. 30; En. I).


O despojamento significa desprendimento de todas as coisas, num ato consciente de se conectar ao máximo naquilo que se quer, buscando nos próprios atos o “Ser do qual tudo depende, para o qual todos os olhares se dirigem” (PLOTINO, 2002, p. 30; En. I). Essa contemplação do Belo e do Bem é o máximo a que aspira e pretende a alma chegar, e a contemplação constante é a chave da vida para superar as leis da matéria, que impedem de se chegar ao topo, “do qual provêm o ser, a vida e o pensamento, pois é a causa da Vida, da Inteligência e do Ser” (PLOTINO, 2002, p. 30; En. I).


Este licopolitano adota com exclusividade a transcendência como a comunicação da vida divina para dentro do mundo. “Então, começa para a Alma a maior de todas as lutas: ela emprega todo o seu esforço para não ser privada dessa alta contemplação” (PLOTINO, 2002, p. 31; En. I). Esta ação constitui o que Plotino chama de êxtase, realidade fundante da Alma penetrada da seiva generosa de Deus, por meio de sua Beleza máxima e acima de todas já vistas. “O infeliz é quem não encontrou o Belo, e apenas ele” (PLOTINO, 2002, p. 31; En. I). Entender isso é entender que só é possível contemplar o verdadeiro e primeiro Belo, se projetando através de si mesmo para além de si mesmo, “é renunciar aos reinos e a dominação da terra, do mar e do céu, uma vez que só abandonando e desprezando essas coisas é possível voltar-se para ele e vê-lo” (PLOTINO, 2002, p. 31-32; En. I).


A doutrina de Plotino é bastante persistente quanto às regras de superar os limites que impedem a possível visão da grande Beleza. Para ele “jamais uma Alma poderia contemplar a Beleza suprema se antes não tornasse bela” (PLOTINO, 2002, p. 34; En. I).  Daí entende-se quando ele fala da necessidade de se assemelhar ao objeto de desejo, lançando-se de uma extremidade à outra, como por exemplo: para se contemplar o Bem, seria necessário tornar-se bom, onde o ato de contemplação fizesse reflexo ao ser contemplado.


Para entender melhor essa ideia é necessário meditar nas palavras do próprio autor: “Portanto, que todo aquele que queira contemplar a Deus e ao Belo se torne antes divino e belo” (PLOTINO, 2002, p. 34; En. I). Para isso é necessário o exercício da liberdade da alma, pelo desprendimento do mundo sensível, por meio da ação inteligível (por meio do intelecto), tendo como principal motivação a íntima união entre o finito e o infinito, entre o ser emanado e o emanador, entre o humano e Deus, numa dimensão ascendente a qual o autor das “Enéadas” enfatiza: “Tornando a subir, chegará primeiro à Inteligência; verá que as ideias são belas e reconhecerá que essa é a Beleza” (PLOTINO, 2002, p. 34; En. I).


Compreende-se que as Ideias são para Plotino os efeitos da visão máxima da Beleza suprema. A visão deste filósofo-teólogo e místico mostra-se numa realidade onde se manifesta a íntima conexão do que provêm com o provedor: “que as Ideias são belas, pois elas provêm da Inteligência e do Ser. Para além da Beleza está o que chamamos de “natureza do Bem”, que irradia de si a Beleza” (PLOTINO, 2002, p. 34; En. I). Continuamente acima de tudo conclui-se que “Em todo caso, a Beleza reside no Mundo Inteligível” (PLOTINO, 2002, p. 34; En. I).




O Bem como via de contemplação, ilimitado e transcendente



A reflexão a seguir é sobre o “Bem” do qual Plotino o concebe como um Bem para além de todos os outros bens. Porque ele é em ato natural imóvel, absoluto e objeto de desejo, o centro onde tudo se volta para ele. E em seu ato natural, o Bem pode ser buscado em qualquer lugar “por ser ele o melhor de todos os seres e transcender a todos os seres; é claro que tem de ser ao mesmo tempo o Bem e o meio pelo qual tudo o mais pode participar” (PLOTINO, 2002, p. 39; En. LIV).


Segundo Plotino “podemos dizer que, para cada ser, o bem é uma vida que está em conformidade com seu ato natural” (PLOTINO, 2002, p. 39; En. LIV).  O ato natural significa a ordem das coisas em seu todo e isso é um bem, a Alma possui isto de extraordinário “o bem é aquilo que está de acordo com seu próprio ato natural” (PLOTINO, 2002, p. 39; En. LIV).


Plotino aponta duas maneiras para que se possa participar do “absoluto Bem”, a primeira é tornar-se semelhante a ele, e a segunda é dirigir para ele todos os seus atos. “Assim, se todas as aspirações e atos se dirigem para o Bem, ele próprio não precisa nem pode visar ou desejar nada além de si mesmo” (PLOTINO, 2002, p. 39; En. LIV). Essa correlação que existe entre o Bem que supera todos os outros bens, ou que, com ele se assemelham e nele todas as partes são entrosadas é o ponto de união entre elas.


Conforme o autor das “Enéadas”, o Bem “permanecendo imóvel, ele é o princípio e a fonte de todos os atos naturais. Ele dá às coisas a Forma do Bem” (PLOTINO, 2002, p. 40; En. LIV). Para ele o Bem é em si mesmo e assim permanece. Ele é a “fonte e a causa” e não sofre nenhum efeito, porém é quem afeta todos os que se dirigem a ele. “Posto que ele está além do Ser, está além do Ato, da Inteligência e do pensamento” (PLOTINO, 2002, p40; En. LIV).


Compreende-se então, que o Bem é transcendente, na medida em que ele supera tudo e nutre a tudo e é o ponto principal da busca, a Forma ideal, a natureza suprema, onde a ordem das coisas em seu todo é um ato natural, por isso o Bem permanece e “Deve permanecer imóvel enquanto circula a seu redor: como uma circunferência ao redor de um centro do qual todos os seus raios provêm” (PLOTINO, 2002, p. 40; En. LIV).


Aqui Plotino refere-se ao Sol como modelo para compreender a autossuficiência do Bem, porque o Sol propaga a sua luz sem sair de si mesmo, e a luz que se propaga não se separa do Sol, por isso “Determinada coisa participa de uma imagem do Bem na medida em que certa unidade, existência e forma estão presentes nela, pois estas são uma imagem da Unidade, do Ser e da Forma (ou arquetípica)” (PLOTINO, 2002, p. 40; En. LIV). De acordo com o texto, esta relação se mostra de forma ascendente, a partir dos movimentos que se voltam em direção de onde se descende ou origina.



A experiência de beatitude de Plotino: a visão da beleza e do Bem




Plotino expressa diretamente uma de suas experiências do Uno relatando um de seus momentos especiais, do qual, experimentou uma esplendida sensação de se unir em alma com a divindade: “muitas vezes ocorreu-me ser retirado do meu corpo e conduzido a mim mesmo; ser retirado das coisas externas e introduzido em mim mesmo” (PLOTINO, 2002, p. 81; En. VI). Subentende-se que, para fazer uma experiência do Uno “Deus”, a alma deve retirar-se do corpo, para encontrar-se consigo mesma numa condição superior, e vincular-se ao Mundo Inteligível (das três naturezas primeiras “hipóstases”: o Uno, a Inteligência e a Alma).


O autor das “Enéadas” transcende a esfera sensível do corpo e se lança em uma experiência além do intuitivo e imaginativo grau místico, e assim, chegando ao êxtase exclama a partir da visão de uma beleza maravilhosa, a qual ele contempla, a sua certeza de pertencer a tão importante “ordem superior dos seres por ter realizado em ato a mais nobre forma de vida” (PLOTINO, 2002, p. 81; En. VI).


Por meio da experiência mística, Plotino percebe uma beleza interior, além da beleza visível. Ele concebe essa experiência como a visão de uma beleza transcendente “Tais belezas só podem ser vistas por aqueles que veem com os olhos da Alma. E quando as veem, experimentam um deleite, uma alegria” (PLOTINO, 2002, p. 25; En. I). Essa alegria chega a ser “assombroso” muito mais que qualquer beleza antes admirada e não como uma criação representativa da realidade “pois nesse caso contemplam o reino da verdadeira Beleza” (PLOTINO, 2002, p. 25; En. I), ele mesmo afirma a sua identificação com a divindade e o fato de ter-se “estabelecido nela” (PLOTINO, 2002, p. 81; En. VI); foi um ato supremo da plenitude e do desejo do que se queria alcançar que é a transcendência mística: o ato de ir além de si mesmo e conectar-se com a divindade.


O ser emanado, por via da relação íntima com a fonte emanadora, torna-se semelhante ao experimentado, torna-se mediador entre a divindade e o mundo material, uma intuição essencialmente do interior, ultrapassando a experiência exterior dos sentidos e mantendo-se em si mesma consegue superar suas limitações imanentes; o que parece é que, a razão perde todo o sentido, e a pessoa sente-se plena de uma beatitude quando em contato mais íntimo com a divindade. Daí se entende o que Plotino diz após sua experiência contemplativa do Uno: “no entanto depois dessa estadia na região divina, quando desço da Inteligência, para o raciocínio” (PLOTINO, 2002, p. 81; En. VI). Este místico pai do neoplatonismo, fala de uma filosofia para além da razão humana, justificando a Inteligência, não como uma espécie de silogismo, mas como algo essencialmente divino, acima do raciocínio, do qual, ele mesmo continua a refletir: “pergunto-me perplexo como é possível a minha Alma estar neste corpo, sendo ela, mesmo estando no corpo essa coisa elevada que se revelou a mim?” (PLOTINO, 2002, p. 81; En. VI).


Para poder alcançar a verdadeira beleza, que está no íntimo da alma humana, Plotino mostra a correlação da imanência à transcendência, que está para além das associações do pensamento, “mas é a causa do pensar para o outro, e a causa não é idêntica ao causado, pois como a Causa de todas as coisas não é nenhum de seus efeitos” (PLOTINO, 2002, p. 81; En. VI). Logo as coisas que formam o mundo, constituem-se a partir de uma manifestação que as supera, pois “As coisas desprovidas de alma dirigem-se à Alma; e esta dirige-se ao Bem por meio da Inteligência. Todas as coisas tem algo do Bem: pois se possuem certo grau de unidade e de existência é por participarem de sua Forma ideal (do Bem)” (PLOTINO, 2002, p. 40; En. I)


Por meio dessa relação sensível da imanência, com a inteligível da transcendência, “assim também a alma, e com mais razão ainda, deve estar desprovida de qualquer forma, de qualquer obstáculo para que seja fecundada e iluminada, pela Natureza Primeira” (PLOTINO, 2002, p. 135; En. IX). E assim a natureza secundária, em sua condição limitada se eleva pela admiração do ilimitado, se eleva na presença do que é superior a ela, e pela unidade com Ele, dispensa toda e qualquer formulação de conceitos, e fica o essencial: “o Bem que está acima de todos os outros bens” (PLOTINO, 2002, p. 134; En. IX).


A acessibilidade ao Uno, parte do desejo e da busca do mesmo. Ela acontece por ‘via da contemplação’ que sobrepõe a qualquer impedimento temporal ou espacial, pois para Plotino, o Uno “não está em algum lugar, deixando os outros lugares privados d’ele, mas está sempre presente para quem pode alcançá-lo e ausente para quem é incapaz de fazê-lo” (PLOTINO, 2002, p. 134; En. IX). Daí se entende que a inacessibilidade ao Uno seria o apego às coisas materiais, ao corpo, enfim, a tudo que é perecível e limitante.


Para o autor das “Enéadas”, não é possível fazer uma experiência contemplativa com a mente inconstante, sem fixá-la exclusivamente no objeto de desejo. O momento meditativo deve permanecer necessariamente e unicamente voltado para o ponto desejado, pois: “Quando a alma está tomada por algo, não pode acolher em si à presença do objeto contrário” (PLOTINO, 2002, p. 135; En. IX). Daqui entende-se a particularidade do exercício para efetivar por meio da contemplação singular do Uno, a união mais perfeita.


Neste ponto da experiência humana, para superar o máximo das expectativas que se alcança por tal ato, o que leva ao ilimitado e para além de um lugar espacial e temporal, Plotino se refere a uma intensidade de efeito da contemplação, que cria um vínculo inseparável, entre aquele que contempla e o objeto contemplado, diferente, pois, dos corpos, os quais impedem os corpos mesmos entre si de se comungarem, acima desse processo estão “as coisas incorporais que não são separadas pelos corpos, nem separadas pelo lugar, mas pela alteridade e pela diferença” (PLOTINO, 2002, p. 138; En. IX). A qual o ser se mostra capaz de apreender o Bem na sua grandeza absoluta; e reconhecer-se num grau menor, não tendo em si alteridade alguma com relação ao Bem, mas buscá-lo na plenitude de sua dignidade.


Digamos do ponto de vista Plotiniano que: “Respiramos e conservamos nosso ser porque esse Bem não retirou os dons que nos deu, nem se afastou, mas sempre os concede a nós enquanto ele for o que é” (PLOTINO, 2002, p. 139; En. IX). Por isso a correlação entre imanência e transcendência se funde mediante a compreensão da articulação que existe entre elas “a Alma contempla a fonte da vida, a fonte da existência, o princípio do Ser, a causa do Bem, a raiz da Alma” (PLOTINO, 2002, p. 139; En. IX).


Nessa perspectiva mística onde o humano encontra-se com a divindade, ele se percebe além do que ele é, há um espanto, um assombramento e um desejo de não mais retornar ao mundo sensível, corruptível, pois esse conhecimento dá a Alma uma outra vida.


Acerca dessas reflexões ficam as expectativas de se fazer uma experiência da divindade em nível total, buscando sempre, segundo a doutrina mística plotiniana, transcender a “paredidade” que tenta nos limitar de ver além das nossas perspectivas, a possibilidade de unir-se plenamente ao mistério adorável, a unidade transcendente a todas as coisas, o Bem supremo, o Belo, o Uno (Deus).


(Observação) “Paredidade”: termo utilizado pelo filósofo autor deste artigo, para explicar — impedimento. Não é palavra existente nos dicionários.



Bibliografia


PLOTINO. Tratado das Enéadas. Tradução de Américo Sommerman. 1ª reimpressão de um texto de 12 Tratados. São Paulo: Polar Editorial, 2002.




(*)Fausto Martins de Moura
Filósofo licenciado pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás



terça-feira, 24 de abril de 2012

A IGREJA PRECISA DOS IDOSOS - POR HUMBERTO PINHO DA SILVA



Eu tinha um amigo, daqueles que sempre estão presente nas horas amargas, que era catequista.


Semanalmente, nos fins-de-semana, abalava para o “ interior”, deixando família, para participar na preparação da catequese.


Certa vez confessou-me: “ Quando for aposentado vou-me dedicar às actividades da Igreja da minha terra e à agricultura. Tenho um campinho na retaguarda da casa que ergui na aldeia e vou cuidar das árvores de fruta e da hortinha”.


O tempo passou e ele sempre a sonhar com a reforma que lhe permitiria organizar melhor a catequese da paróquia, já que era o coordenador.


Um dia atingiu a idade necessária para se retirar. Despediu-se de olhos marejados dos colegas; pela derradeira vez visitou a banca de trabalho, testemunha de horas alegres e de muitas e muitas angústias; e definitivamente partiu para a terra natal.


Não deixou, porém, de passar pela livraria católica em busca de material para as aulas da catequese. Como as verbas para a evangelização dos jovens eram escassas, despendeu muito de seu bolso.


Era um sonho há muito acalentado.


Mal chegou, foi prestes à reunião da catequese. Admirou-se, porém, que o abade, velho companheiro nas lidas religiosas, estivesse presente.


Aberta a reunião, o padre urdiu eloquentes palavras, entremeada de rasgados elogios ao meu amigo. Apoiaram enternecidos, os presentes, as palavras do sacerdote. Ao concluir ofertaram-lhe bonita bíblia, de folhas doiradas, encadernada a pele.


No acto da entrega, disse o abade:” Chegou o momento de descansar. É justo que o libertem das árduas canseiras que lhe roubaram horas de recreação. É mister sangue novo. Já indigitei novo coordenador, e faço votos que ao aposentar-se, tenha finalmente o merecido repouso, junto dos que lhe querem bem.”


Escusado será descrever a desilusão do meu amigo. Mesmo assim teve ânimo para agradecer, lembrando que não se sentia velho, e muito podia,ainda, dar à Igreja.


Este caso verídico faz-me reflectir na perda que a Igreja tem ao desprezar o trabalho dos idosos.


Há muito que lembro – mas, infelizmente, poucos escutam, – que muitos professores, homens de valor, ilustres catedráticos, após aposentação, podem ser excelentes sacerdotes (diáconos e padres), consoante os casos, com reduzido estudo no Seminário Maior.


O aposentado, em regra, tem tempo disponível; não carece de trabalhar para sobreviver; e pode perfeitamente dispor ainda de vinte anos ou mais, ao serviço de Deus.


Desaproveitar conhecimentos e disponibilidades é erro crasso, mormente em época em que a falta de sacerdotes é notória.


Bom era que as dioceses incentivassem os crentes idosos a participarem nas actividades das paróquias, de harmonia com os conhecimentos e saúde de cada um.

HUMBERTO PINHO DA SILVA - Porto, Portugal



sexta-feira, 20 de abril de 2012

Quem controla o alucinógeno chá do Santo Daime?



Exclusivo VEJA.com


Natalia Cuminale
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(Agência Estado)


Ao liberar o uso do chá da ayahuasca para fins religiosos, no começo deste ano, o Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad) também reconheceu, ao menos implicitamente, que o consumo do alucinógeno é arriscado. Daí a existência, na mesma resolução, de regras como a proibição de que pessoas com histórico de transtornos mentais ou sob efeito de bebidas alcoólicas ou outras substâncias psicoativas ingiram a droga, e a obrigatoriedade de que as seitas do Daime "exerçam rigoroso controle sobre o sistema de ingresso de novos adeptos". Faltou, no entanto, o mais importante: prever os mecanismos para que essas regras sejam implementadas com alguma eficácia. Quem fiscaliza as seitas para saber se elas estão controlando o ingresso dos novos adeptos? Quem identifica os portadores de transtornos mentais - os líderes religiosos? Quem será responsabilizado caso a resolução não seja seguida? Fazer essas perguntas às autoridades leva, hoje, a um série de contradições... alucinante.


Segundo Paulo Roberto Yog de Miranda Uchôa, chefe da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad) - que exerce a função executiva do Conad –, a fiscalização acerca do uso do chá cabe tanto "às instâncias que congreguem as entidades usuárias" (ou seja, entidades como Cefluris e a União Vegetal, que têm vários templos espalhados pelo país) como "aos diversos órgãos da administração pública, conforme suas competências específicas". Vladimir de Andrade Stempliuk, coordenador-geral do Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas, subordinado ao Senad, é mais específico: "Compete aos diversos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas a fiscalização e a imposição de medidas legais caso estas sejam pertinentes", explica. Dessa forma, se tornariam responsáveis, por exemplo, o próprio Conad e, indiretamente, entidades como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Polícia Federal (PF), que compõem o Conselho Nacional.


Mas nem todos entendem assim. Procurada pela reportagem, a Anvisa afirmou que a ayahuasca não faz parte da lista de substâncias que caem sob seu controle. Já o Ministério da Saúde encaminhou a reportagem para o Conad, alegando com razão ter sido esse órgão "quem regulamentou o uso religioso dessa bebida no Brasil". Igualmente, o Ministério Público Federal, apontou para o Conad. Os promotores, contudo, podem agir caso haja descumprimento da fiscalização. Ainda segundo o MPF, "nenhum procedimento nesse sentido" está registrado na base de dados da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC).


A resolução do Conad recomenda ainda que a produção da bebida seja auto-sustentável, veta seu comércio e propaganda do composto e estabelece que o cultivo e o transporte só devem ocorrer para fins religiosos. Mas quem, de fato, fiscaliza a produção e comércio dessas plantas? A Polícia Federal, por exemplo, alega que sua função se restringe ao controle do DMT (n-dimetiltriptamina), a substância alucinógena do chá da ayahuasca. "Se isolado, o DMT passa a ser droga proibida, portanto conduzi-la ou comercializá-la será crime a ser enquadrado na lei contra uso e tráfico de entorpecentes", explica em nota. Fiscalizar o plantio da erva-rainha ou do cipó-jagube, dos quais são extraídos o DMT, portanto, não seria atribuição da PF.


Claudio RossiBuracos na lei - Para os juristas, os furos no sistema criado pela resolução do Conad são gritantes. "O poder público pecou em não regulamentar mais clara e objetivamente o uso do chá", diz o advogado criminalista André Alves Wlodarczyk. Ao que o advogado constitucionalista João Wiegerinck acrescenta: "Por eliminação, percebemos que a fiscalização só será feita quando provocada: quando alguém passar mal ou surtar com a bebida. Obviamente, é uma falha." Não há dúvida de que a própria entidade religiosa que faz uso do chá poderá ser responsabilizada em caso de dano a um fiel, se não forem observadas as orientações da resolução do Conad. "A igreja tem o dever de indenizar, se for provado que ministrou sem os cuidados que a resolução determinava", diz Wlodarczyk. Pode, em tese, vir a ser o caso da Céu de Maria, seita fundada pelo cartunista Glauco e onde seu assassino, Carlos Eduardo, bebia o daime. Isso porque, Carlos Grecchi, pai de Carlos Eduardo, afirma ter pedido a Glauco que parasse de dar o daime ao filho em 2007. Não teria sido atendido.


Saúde pública – A resolução também é criticada por profissionais da saúde pública. Ela entrega aos próprios religiosos a responsabilidade de dizer quem está apto a tomar ou não o chá. Mas essa deveria ser uma tarefa de psicológos ou psiquiatras. Segundo Dartiu Xavier da Silveira, psiquiatra da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e presidente do Grupo Multidisciplinar de Trabalho do Conad, "o uso do chá é arriscado para pessoas que tomam antidepressivos e é contra-indicado a pessoas com diagnóstico de psicose, já que aumenta muito a produção de certas substâncias no cérebro". Para ele, o Conad deveria desenvolver algum tipo de instrumento para aferir se as entidades religiosas estão realizando o questionário ou não. "A falta de fiscalização pode levar o aparecimento de vários casos graves”, diz Silveira.


Preocupado com as brechas deixas pela resolução do governo sobre o daime, o psiquiatra Emmanuel Fortes, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM) e novo representante do órgão no Conad, acredita que o atual estado de coisas pode desaguar em um problema de saúde pública. "É uma temeridade. As pessoas não saem por aí dizendo se têm doença mental ou não. Isso merece uma reflexão por parte do Conselho Federal de Medicina", diz, criticando abertamente a capacidade de as entidades religiosas decidirem quem pode ou não tomar o chá. "Com a ampliação e o crescimento organizado de novas seitas, os casos de efeitos colaterais indesejados e o agravamento de estados psíquicos começarão a aparecer", acredita Carlos José Renaut Filho, psiquiatra da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), que presta consultoria a uma entidade daimista no Rio de Janeiro.


Esta matéria está na Revista Veja e pode ser acessada clicando neste link:

http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/afinal-quem-controla-alucinogeno-cha-santo-daime

quarta-feira, 18 de abril de 2012

VOCÊ ACREDITA NA VIDA APÓS O NASCIMENTO?


Vejam este criativo e.mail enviado pelo meu amigo Dr. João Augusto Lopes. Infelizmente não sabemos de quem é a autoria. Caso eu venha a descobrir, colocarei a devida observação.





de: Joao A. Lopes adv.jalopes@gmail.com

para: lcarlosnogueira@gmail.com
data: 18 de abril de 2012 15:31

assunto: Fwd: Qualquer semelhança não é mera coincidência

enviado por: gmail.com

assinado por: gmail.com




Assunto: Qualquer semelhança não é mera coincidência

Qualquer semelhança não é mera coincidência

um boa reflexão sobre a teoria reencarnacionista: alguns dizem q não existe vida após a morte, outros não desacreditam, mas não crêem totalmente.

e vc? /eu envio um texto q acho q vai ajudar a refletir.

abr

Perfeito! óoooootimo!


Não deixe de ler !!!!! Muito bom !


Belíssima analogia: simples, objetiva e direta.

No ventre de uma mulher grávida estavam dois bebês. O primeiro pergunta ao outro:

- Você acredita na vida após o nascimento?

- Certamente. Algo tem de haver após o nascimento. Talvez estejamos aqui principalmente porque nós precisamos nos preparar para o que seremos mais tarde.

- Bobagem, não há vida após o nascimento. Como verdadeiramente seria essa vida?

- Eu não sei exatamente, mas certamente haverá mais luz do que aqui. Talvez caminhemos com nossos próprios pés e comeremos com a boca.

- Isso é um absurdo! Caminhar é impossível. E comer com a boca? É totalmente ridículo! O cordão umbilical nos alimenta. Eu digo somente uma coisa: A vida após o nascimento está excluída. O cordão umbilical é muito curto.

- Na verdade, certamente há algo. Talvez seja apenas um pouco diferente do que estamos habituados a ter aqui.

- Mas ninguém nunca voltou de lá, depois do nascimento. O parto apenas encerra a vida. E afinal de contas, a vida é nada mais do que a angústia prolongada na escuridão.

- Bem, eu não sei exatamente como será depois do nascimento, mas com certeza veremos a mamãe e ela cuidará de nós.

- Mamãe? Você acredita na mamãe? E onde ela supostamente está?

- Onde? Em tudo à nossa volta! Nela e através dela nós vivemos. Sem ela tudo isso não existiria.

- Eu não acredito! Eu nunca vi nenhuma mamãe, por isso é claro que não existe nenhuma.

- Bem, mas às vezes quando estamos em silêncio, você pode ouvi-la cantando, ou sente, como ela afaga nosso mundo. Saiba, eu penso que só então a vida real nos espera e agora apenas estamos nos preparando para ela…