Eu tinha um amigo, daqueles que sempre estão presente nas horas amargas, que era catequista.
Semanalmente, nos fins-de-semana, abalava para o “ interior”, deixando família, para participar na preparação da catequese.
Certa vez confessou-me: “ Quando for aposentado vou-me dedicar às actividades da Igreja da minha terra e à agricultura. Tenho um campinho na retaguarda da casa que ergui na aldeia e vou cuidar das árvores de fruta e da hortinha”.
O tempo passou e ele sempre a sonhar com a reforma que lhe permitiria organizar melhor a catequese da paróquia, já que era o coordenador.
Um dia atingiu a idade necessária para se retirar. Despediu-se de olhos marejados dos colegas; pela derradeira vez visitou a banca de trabalho, testemunha de horas alegres e de muitas e muitas angústias; e definitivamente partiu para a terra natal.
Não deixou, porém, de passar pela livraria católica em busca de material para as aulas da catequese. Como as verbas para a evangelização dos jovens eram escassas, despendeu muito de seu bolso.
Era um sonho há muito acalentado.
Mal chegou, foi prestes à reunião da catequese. Admirou-se, porém, que o abade, velho companheiro nas lidas religiosas, estivesse presente.
Aberta a reunião, o padre urdiu eloquentes palavras, entremeada de rasgados elogios ao meu amigo. Apoiaram enternecidos, os presentes, as palavras do sacerdote. Ao concluir ofertaram-lhe bonita bíblia, de folhas doiradas, encadernada a pele.
No acto da entrega, disse o abade:” Chegou o momento de descansar. É justo que o libertem das árduas canseiras que lhe roubaram horas de recreação. É mister sangue novo. Já indigitei novo coordenador, e faço votos que ao aposentar-se, tenha finalmente o merecido repouso, junto dos que lhe querem bem.”
Escusado será descrever a desilusão do meu amigo. Mesmo assim teve ânimo para agradecer, lembrando que não se sentia velho, e muito podia,ainda, dar à Igreja.
Este caso verídico faz-me reflectir na perda que a Igreja tem ao desprezar o trabalho dos idosos.
Há muito que lembro – mas, infelizmente, poucos escutam, – que muitos professores, homens de valor, ilustres catedráticos, após aposentação, podem ser excelentes sacerdotes (diáconos e padres), consoante os casos, com reduzido estudo no Seminário Maior.
O aposentado, em regra, tem tempo disponível; não carece de trabalhar para sobreviver; e pode perfeitamente dispor ainda de vinte anos ou mais, ao serviço de Deus.
Desaproveitar conhecimentos e disponibilidades é erro crasso, mormente em época em que a falta de sacerdotes é notória.
Bom era que as dioceses incentivassem os crentes idosos a participarem nas actividades das paróquias, de harmonia com os conhecimentos e saúde de cada um.
HUMBERTO PINHO DA SILVA - Porto, Portugal
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