Luiz Carlos Nogueira
Conta-se que depois do “Primeiro
Concílio Budista”, organizado pelo monge Kassapa, por volta de 400 a .C, na Caverna de das
Sete Folhas, em Rajagaha, com a finalidade do monge Ananda que conviveu
diretamente com Sidarta Gautama, reproduzir, de cor, tudo quanto ouviu de Buda
(O Iluminado).
A partir daí o Budismo teve início como religião organizada,
que segundo o monge Stephen Batchelor[1] “Até
Buda, portanto, se sentiu oprimido pela organização que ele próprio
criara a fim de preservar e disseminar seus ensinamentos.”, mas, no
entanto, Batchelor acrescenta: “Porém, se
não houvessem sido organizadas em ortodoxias e instituições, as ideias de
Guatama teriam sobrevivido? Por
mais que eu simpatize com Ananda em seu conflito com Kassapa, devo reconhecer
que, sem a liderança agressiva de um homem com este último numa época tão
instável, O Dharma talvez fosse esquecido na geração seguinte à morte de Buda. Se os mosteiros de Será e Songgwangsa não
permanecessem por séculos como baluartes de suas respectivas tradições
budistas, teria eu recebido a educação e o treinamento graças aos quais posso
hoje escrever sobre o budismo? Duvido muito. Quer goste ou não, o espírito que anima a vida religiosa e sua
organização formal me parece — com Buda e Mara — inextrincavelmente ligados um
ao outro.” “Trocar a religião organizada por uma ‘espiritualidade’ nebulosa e
eclética também não é uma solução satisfatória.” (pág.297)
Nota: Mara, segundo o Cânone Páli, é a personificação da astúcia e do mal – portanto — o demônio.(pag.313)
Mas é interessante notarmos como
as opiniões divergem neste sentido. Por exemplo Jiddu Krishnamurti[2]
quando rompeu com a Ordem da Estrela do Oriente, na qual foi colocado como
chefe, porque segundo sua mãe adotiva Anie Besant, ele seria a nova encarnação
do Messias (Bodhisatwa Maitreya), condição que ele se
recusou de assumir, disse que: ''A verdade é uma terra sem caminho. O
homem não chegará a ela através de organização alguma, de qualquer crença de
nenhum dogma, de nenhum sacerdotal ou mesmo um ritual, nem através de nenhum
conhecimento filosófico ou técnica psicológica. Ele vai encontrá-la através
do espelho do relacionamento, através do entendimento dos conteúdos de sua
própria mente, através da observação, e não através de análise intelectual ou
dissecação introspectiva".
Em seu
discurso quando desse rompimento, Krishnamurti
contou uma história, em que: "O
diabo e um amigo estavam passeando quando viram, a sua frente, um homem
abaixar-se e pegar algo brilhante do chão. O homem olhou para aquilo com
deleite, colocou-o no bolso e continuou caminhando. O amigo perguntou: "O
que aquele homem achou que o transformou tanto?" O diabo respondeu:
"Eu sei, ele encontrou a verdade." "Por Deus!"- exclamou
seu amigo: "Isto deve ser um mau negócio para você!". "De jeito
nenhum"- o diabo respondeu com um sorriso malicioso: "Vou ajudá-lo a organizá-la,
você vai ver só!".
Então Krishnamurti indagou: "Pode a verdade ser organizada? Você
pode encontrar a verdade através de uma organização? Elas estão baseadas em
diferentes crenças. Crenças e organizações estão sempre separando as pessoas,
excluindo umas das outras. Você é um hindu e eu sou um mulçumano, você é um
cristão e eu sou um budista. Crenças, ao longo de toda a história, atuaram como
uma barreira entre os seres humanos. Nós falamos de fraternidade, mas se você
tem uma crença diferente da minha, estou pronto para cortar sua cabeça; nós
temos visto isso acontecer inúmeras vezes.”
Continuando, disse: "A experiência de Deus deve ser experimentar por si mesmo. Ela não pode ser organizada. No momento que é organizada, propagada, ela cessa de ser verdade, ela se torna uma mentira. O real, o imensurável, não pode ser formulado, não pode ser colocado em palavras. O desconhecido não pode ser medido pelo conhecido, pela palavra. Quando você o mede, ele cessa de ser verdade, deixa de ser real e, portanto, é uma mentira".
Continuando, disse: "A experiência de Deus deve ser experimentar por si mesmo. Ela não pode ser organizada. No momento que é organizada, propagada, ela cessa de ser verdade, ela se torna uma mentira. O real, o imensurável, não pode ser formulado, não pode ser colocado em palavras. O desconhecido não pode ser medido pelo conhecido, pela palavra. Quando você o mede, ele cessa de ser verdade, deixa de ser real e, portanto, é uma mentira".
Assim é
em toda organização humana. As dissensões, as disputas pelo poder, as vaidades,
enfim, todas as manifestações das deficiências e propensões do ser humano têm
que conviver, digamos, sobre o mesmo teto.
No
entanto, não se pode negar que apesar de tudo, as religiões oferecem ou servem
como algum norte, consolo ou conforto espiritual/psicológico, para quase a
totalidade das pessoas, diante dos seus problemas existências e seus
infortúnios. Aliás, a busca pelo sagrado constitui um poderoso antídoto contra
o sofrimento humano. Até mesmo um ateu reconhece isso.
O
físico ateu Marcelo Gleiser, conta em seu livro “Criação Imperfeita”[3],
que certa vez, quando de uma entrevista para a Rádio AM de Brasília, na estação
rodoviária daquela Capital, rodeado de operários e diaristas, falando de como a
ciência explica a origem do universo de acordo com a teoria do Big Bang. Eis, porém, que de repente um
trabalhador sujo de graxa e com rugas precoces no rosto, ergueu a mão olhando
fixamente para ele, e perguntou-lhe: “Quer dizer que o senhor quer tirar até Deus
da gente?”. (pag.41)
Gleiser
olhou chocado para aquele homem, sabendo que o que ele lhe indagava naquele
momento, representava o questionamento de bilhões de outras pessoas.
De tal
sorte, o físico referiu-se a Karl Marx, quando este disse que “a religião é o
ópio do povo” e acrescentou: “Se a intenção de alguns é tirar a religião
das pessoas, é bom oferecer um outro tipo de ópio. O que o ateísmo oferece —
mesmo com todo o seu apelo à razão e à lógica da ciência — não vai funcionar.
Ao menos não como costuma ser apresentado, sem qualquer vestígio de
espiritualidade.”. Gleiser observa que para evitar confusão, explica que
para ele, “espiritualidade não está
ligada a uma dimensão religiosa sobrenatural, oposta ao mundo material. Também
não está ligada a uma possível conexão espiritual com a ‘mente de Deus’ que os
unificadores buscam numa Teoria Final. O que inspira a minha espiritualidade é
a ligação profunda que sinto com a Natureza, é uma celebração da vida.”
(págs.41,42)
[1]
Batchelor, Stephen, Confissões de um ateu budista, tradução de Gilson César
Cardoso de Souza — São Paulo: Pensamento, 2012.
[2] (http://www.bernie.cncfamily.com/k_pathless.htm)
e (http://www.jornalinfinito.com.br/materias.asp?cod=70),
sites acessados em 17/03/2013
[3] Gleiser,
Marcelo, 1959,Criação Imperfeita — 5ª edição — Rio de Janeiro: Record, 2012
Meu caro.
ResponderExcluirUm dia eu disse em uma reunião entre confrades uma frase que abalou todas as estruturas. Não sei se vc estava lá
naquela noite, mas eu disse que tinha descoberto A VERDADE ABSOLUTA. Houve um pânico silencioso entre os presentes e uma pergunta uninânime: QUAL É?
Então, com muita calma, respondi: A MINHA. E CADA UM DE VOCÊS TEM A SUA VERDADE ABSOLUTA.
Taí, eu nem tenho certeza das minhas verdades, apenas desconfio que elas possam ser, não obstante tudo seja transitório e impermanente. Neste mundo nada que achamos que pode ser - é, as vezes, a realidade.
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